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2 de fev. de 2009

AMAZÔNIA EM CAPÍTULOS: III – É POSSÍVEL PROGREDIR SEM DESTRUIR?









“Ecologistas/ambientalistas”, defensores irredutíveis da preservação ambiental são incompreendidos quando afirmam que é possível progredir sem desmatar. Seus oponentes, os progressistas (no outro extremo) acham utópica essa pretensão dos ambientalistas. E se lançam na destruição. Em ecologia, nós sabemos que há dois processos distintos: conservação e preservação ambiental. Estes dois processos se distinguem pelo fato primordial de que: na conservação, pode-se utilizar determinado recurso natural (ou recursos), mantendo-se as características estruturais e funcionais do meio ambiente; enquanto na preservação, a Natureza é mantida intocada.
No caso da região amazônica mostra-se óbvio para a maioria dos pesquisadores, que há locais da floresta onde se deve manter o ecossistema intocado; e há locais que devem ser explotados em benefício das populações humanas que ali vivem (14,6 milhões na região Norte). Solos de terra-firme com floresta densa (53,63% da Amazônia), assim como muitas áreas de florestas abertas (25,48%) estão entre as áreas com priorização de preservação, pois estão esses ecossistemas sobre latossolos originalmente pobres em nutrientes. Mas há locais com solos férteis, propícios à implantação de projetos de desenvolvimento sustentável.
Na correria do progresso a qualquer custo, atropela-se, destrói-se, desperdiça-se e com isso, há sérios comprometimentos ao tão propalado desenvolvimento sustentável. A ânsia (e ganância) em obter lucros conduz a conquistas ilegítimas e utilizações inapropriadas dos recursos. Vamos inicialmente tomar dois exemplos: exploração madeireira e potencial hidrelétrico. Os dois estão intimamente relacionados, porque a instalação de UHE (Usinas Hidrelétricas) causa antes de tudo, grandes impactos sobre a floresta, comprometendo a preservação da biodiversidade e (se não for bem planejado) impedindo a explotação racional do recurso madeireiro. Vamos relembrar o caso Tucuruí (ilustrado na foto acima), no rio Tocantins, a 250 km de sua foz. É bem possível que desde sua inauguração (em 1984, pelo então presidente João Batista Figueiredo) até os dias de hoje, ainda se retire madeira que permaneceu após inundação da área do reservatório. Estima-se uma perda de 2,5 milhões de metros cúbicos de madeira (multiplique por uma média de U$900 o metro cúbico e verás o prejuízo!). Problemas de cunho social são apontados desde sua construção no município de Tucuruí, hoje com 100 mil habitantes.
Com relação ao potencial madeireiro da Amazônia, volto a citar um dos números especiais da revista Scientific American Brasil (2008), em que os autores do artigo “Biodegradação e Preservação de Madeiras” (Ceci S. da G. Campos e colaboradores) apresentam alguns dados que mostram a situação da explotação desse fabuloso recurso natural. Vejamos alguns: (1) Potencial madeireiro: o INPA – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia já identificou 2.750 espécies de árvores; (2) das 2 mil espécies de árvores com potencial econômico, as madeireiras só se utilizam de 60; (3) são priorizadas as madeiras nobres e o restante é queimado; (4) a perda por deterioração, principalmente biodegradação, supera os 60% (ver foto de madeira a ser transportada boiando nos rios); (5) um grande potencial da própria floresta, preservantes naturais para conservar as madeiras menos nobres, perde-se por falta de pesquisas. Dados mostrados por André Trigueiro, no seu livro “Mundo Sustentável” (2005, Edit. Globo, São Paulo) dão conta de que a indústria moveleira utiliza 20% da madeira de uma árvore, desperdiçando 80%.
É muito comum a inversão de prioridades no que diz respeito às duas alternativas seguintes: (1) substituição da floresta por sistema que se tradicionalizou como rentável, como pastagens para o gado bovino (mas não na Amazônia; ver Capítulo II nesta série) ou (2) manutenção do ecossistema original, procurando-se explorar seu potencial natural. Tal é o caso por exemplo, da castanheira. Esta árvore é capaz de produzir centenas de toneladas de castanha-do-brasil (ou castanha-da-amazônia, ou castanha-do-pará) por ano. O preço médio dessa castanha nos nossos supermercados alcança até R$40,00 por quilo. É uma iguaria altamente procurada entre os consumidores europeus e norte-americanos, principalmente nos chocolates. Descoberta recente de seu alto teor em selênio (estimulante de enzimas que combatem os radicais livres, relacionados ao envelhecimento celular) aumentou sua procura. A preservação da castanheira prevista em lei leva a situações como a mostrada na foto acima. Essa árvore não consegue sobreviver sem a floresta por mais de uma dúzia de anos.
Neste ponto é bom lembrar a experiência do Quênia, na África, com o ecoturismo relacionado ao leão. Esta forma de turismo substituiu a caça ao leão. O ecoturismo rende por um período de sete anos de vida adulta de um leão, U$500 mil dólares; enquanto a caça ao leão rendia por sua pele, não mais do que U$1 mil dólares (segundo Miller,G.T. (1996) “Living in the Environment”). Transferindo tal situação para a Amazônia: não tenho nenhuma dúvida de que “a floresta em pé” renderá mais dividendos (eco-econômico-social) do que ela queimada! O ecoturismo é indubitavelmente um grande potencial pouco e mal explorado na Amazônia.
As reservas extrativistas (aspectos positivos mostrados em Emperaire, L.(2000) “A Floresta em Jogo: o Extrativismo na Amazônia Central”) não têm sido valorizadas como modelo de sustentabilidade.
Reservas de Desenvolvimento Sustentável como Mamirauá (1.124.000 ha = 11.240 km2, situada nas margens do rio Solimões no Alto Amazonas), assim como a de Amanã (2.350.000 ha = 23.500 km2 entre o rio Negro e os rios Japurá e Solimões na região central do estado do Amazonas), são provas vivas de desenvolvimento sustentável. Elas mostram o aspecto positivo do envolvimento das populações humanas locais como participantes ativos do manejo dos recursos naturais (em Mamirauá mais de 300 espécies de peixes, 400 de aves e 45 de mamíferos) e na vigilância da reserva.
Vários outros exemplos poderiam ser citados, como o descrito por André Trigueiro (acima citado): uma floresta pública em regime de operação comercial, no Acre, envolvendo seringueiros, organizados em cooperativas, que retiram madeira (média de 2 árvores/ha) sem comprometer a capacidade da floresta se recompor. Estudos de solos, bacias, seringais nativos, levantamento socioeconômico das populações humanas, precedem a explotação. A Secretaria de Florestas do Acre estimou geração anual de riqueza com tal explotação, da ordem de U$1 bilhão por ano.
Não dispomos aqui neste “ecologiaemfoco” de espaço para um desfile de desencontros referentes a todas as questões levantadas sobre desmatamento. Ampla informação existe no documento “Indicadores de Desenvolvimento Sustentável - Brasil 2008” disponibilizado em PDF no site http://www.ibge.gov.br/ (ver Dimensão Ambiental - Terra, nesse documento). E muitas informações (e notícias recentes do Fórum Social Mundial) estão disponíveis no site http://www.amazonia.org.br/. Em destaque o documento em PDF divulgado nesse site, intitulado “O Rastro da Pecuária na Amazônia: MT o estado da destruição”. Um reforço ao que vimos no Capítulo II, desta série. Esse Estado tem 35% do seu território inserido no bioma Pantanal e o restante no bioma Amazônia. Mas seu governo prefere priorizar o agronegócio e manter-se como líder da devastação da Amazônia. O Pará ocupa o segundo lugar.

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